sexta-feira, 31 de julho de 2009

A revolução do voto pela Cultura

31/07/2009

Por Josias Luiz Guimarães

O processo eleitoral, no Império, era constituído por votantes e eleitores. Os votantes escolhiam os eleitores e estes os representantes no parlamento, ou seja, deputados, vez que os senadores eram escolhidos, em lista tríplice, pelo imperador. Em 1881, houve o que poderia ser nominado de salto de qualidade no processo eleitoral; no entanto, a sociedade nunca foi preparada, instruída, para a inusitada mudança promovida pela Lei Saraiva (gabinete), Decreto 3029, aprovado pelo parlamento do Império. Não havia nem escolas para instruir os eleitores no tocante à nobre arte de votar, tampouco vontade soberana para fazer funcionar, mesmo, a nova lei: escolas ensinando a ler, escrever, pensar e votar e, deste modo, saborear, de fato, a liberdade. Isso me leva aos tempos idos e vividos de estudante, quando cursava o saudoso Liceu de Goiás: Vila Boa. Havia, apenas, quatro ginásios oficiais, no, ainda, grande Estado, o quarto da União. O curso secundário era dividido em primeiro e segundo ciclo: ginásio e científico. Havia exame de admissão para ingressar no liceu. Naquele tempo, o ensino da moral e cívica já era sofrível. Consistia de ligeiras noções, aulas teóricas sobre o assunto. Quase sempre não havia professores; então, o diretor do liceu, na época, saudoso professor Alcides Ramos Jubé, supria a lacuna, em gesto de boa vontade e dedicação à causa do ensino. Recordo-me também da presença enérgica do impecável Inspetor Federal, professor Agenor Alves de Castro, vigilante no que diz respeito à fiscalização, transparência na realização das provas e do chefe de disciplina severo, Hugo, na manutenção da ordem. O liceu foi o segundo estabelecimento de ensino fundado, no País, pelo imperador Dom Pedro II. Hoje, justiça seja feita, há cursos secundários instalados até nas vilas, distritos. Todavia, pari e passo, à quantidade, falta qualidade; então a sociedade mantenedora que carrega, curvada, uma carga tributária superior a 38% do PIB, tem que se organizar; fazer valer tanto os seus direitos de contribuinte, como aqueles definidos pelo capítulo III, da educação, artigo 205 da Constituição soberana: educação direito de todos, dever do Estado e da família; monitorando tanto aquele como esta, no cumprimento de suas obrigações legais, à ultima questionando o cumprimento da responsabilidade paternal, pois, na conjuntura atual, há pais que chegam a constituir até quatro famílias, deixando filhos no ermo a tramar contra a sociedade carente de segurança, segurança obrigação do Estado, este vítima de maus gestores. Todo dever, como o de pagar imposto, votar, leva a um direito, de igual forma, todo direito pressupõe um dever. Assim subsidiada, respaldada por esse axioma jurídico, cabe a ela, legitimadora dos eleitos, munir-se de vontade soberana; aquela mediadora entre o instinto que cobiça e o espírito que conhece, racionaliza (lisura) embasada nos seus direitos, promover o grande salto de qualidade, pois o simples gesto na maneira de pensar e agir, em cadeia, contágio positivo, poderá levar a substituição do voto de cabresto, mercantilizado, inconsciente, pelo voto qualidade, consciente consubstanciando a participação de todos na vida política de sua terra. Essa, certamente, representa a mais legítima das revoluções; a revolução pela cultura. Ainda hoje, pouco mais de 1% dos estudantes que terminam o curso secundário transpõem os umbrais da universidade; milhões deles, por questões financeiras, param de estudar ao término do curso secundário, outros trancam a matrícula na universidade, passam a mourejar no subemprego. Isto acontece por falta de uma política educacional capaz de identificá-los, como a bola de cristal eletrônica, reconduzindo-os à formação superior, financiando seus estudos a custos compatíveis, com cronograma de ressarcimento a um virtual fundo educacional, a partir do 5° ano de formado. Tivesse o Estado exercitando a política como foi concebida: a arte de bem governar, racionalizando, minimizando custos e, ao mesmo tempo, maximizando benefícios à sociedade, já havia recursos substanciais para a constituição de fundo dessa natureza. Educação constitui o melhor investimento que o Estado pode fazer no combate à pobreza; melhoria de padrão de vida, desconcentração de renda, subtraindo a atual posição desconfortável de um dos países de maior concentração de renda do planeta. Neste País, o jovem, quando forma profissionalmente, não forma politicamente; a grande maioria deixa a universidade néscio em política. As escolas, do Jardim da Infância ao doutoramento, pouco ou quase nada ensinam de educação cívica, mal sabendo que o sistema democrático, considerado a melhor forma de governo do mundo, para funcionar bem, carece dela como instrumento indutor da participação aguerrida da população, na vida política do município, Estado e País. Com a Proclamação da República, a escola obrigatória, gratuita, laica, tornou-se uma exigência indispensável para a edificação nacional. Mesmo assim, a sociedade nunca foi preparada para a nova ordem constituída. Então, cabe a ela, munida daquela vontade soberana, reverter o atual cenário politiqueiro que a carcome, como o boi de piranha da moda de viola, se organizando em associações cívicas, mais poderosas ainda do que as Ongs, a partir dos municípios, criando, legitimadas por aquele sovado axioma jurídico, já mencionado, dispositivos controladores, fiscalizadores dos eleitos; planejando, executando, avaliando programas eficazes, aliados a arte de governar, fazendo coro ao lema da bandeira do Estado de São Paulo, “No duccor, ducco”- conduzo, não sou conduzido.
Josias Luiz Guimarães é veterinário pela UFMG, pós-graduado em Filosofia Política pela UCG e pecuarista

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